A Seca que Queima por Dentro: vozes esquecidas na literatura

Igor Hadji, Isabela Lopez, João Guilherme

6/11/20252 min read

brown grass field under blue sky during daytime
brown grass field under blue sky during daytime

Fabiano mal consegue expressar o que sente. Suas palavras são secas como a paisagem ao seu redor. Preso entre o silêncio e a brutalidade, sua fala limitada revela muito mais do que parece: mostra o abandono de um povo inteiro, deixado à margem, sem acesso à educação, aos direitos mais básicos, à própria identidade. Sua esposa, Sinhá Vitória, alimenta o sonho de uma vida mais digna, uma casa de verdade, um lar onde não haja medo. Seus filhos crescem sem entender o mundo, sem compreender a linguagem que poderia libertá-los. Eles não sabem nomear o que sentem, e talvez por isso nunca saibam que têm o direito de desejar mais.

Do outro lado, os Joad atravessam os Estados Unidos em busca de um recomeço, mas encontram rejeição e miséria. São recebidos com hostilidade em terras onde esperavam acolhimento. Tratados como ameaça, como números indesejados, acabam explorados por fazendeiros ricos que lucram com sua fome. A promessa do sonho americano se desfaz na poeira das plantações.

Ambas as obras escancaram a injustiça social. Elas revelam que, enquanto poucos acumulam terras, poder e riqueza, milhões vivem sem sequer o direito de existir com dignidade. A seca, em ambos os cenários, é mais do que um fenômeno climático. É metáfora da ausência: ausência de políticas públicas eficazes, de oportunidades, de cuidado com o outro. Mas também é cenário de resistência. Porque, mesmo esmagados pela injustiça, os personagens não se rendem. Eles continuam. Caminham. Tentam. E nisso há uma força poderosa.

Há também o que não é dito, mas pulsa nas entrelinhas. O silêncio de Fabiano fala mais alto do que qualquer grito. A submissão diante da polícia, o medo constante, a linguagem pobre, tudo revela uma violência estrutural que opera sem precisar ser nomeada. Nos Joad, o desalento e o cansaço vão tomando o lugar das palavras. Há momentos em que o que não se diz, o que se cala por vergonha, por cansaço ou por medo, grita no texto com mais força do que os diálogos.

Ler essas obras é mais do que acompanhar uma narrativa. É ouvir vozes que raramente são escutadas. É perceber que a desigualdade não é só estatística ou dado de pesquisa. Ela é concreta, cotidiana, cruel. É entender que o silêncio de um personagem pode carregar gerações de opressão, e que a luta por justiça social começa com algo aparentemente simples: a capacidade de enxergar o outro. Enxergar suas dores, seus sonhos, sua humanidade.

E a pergunta que fica é:

  • Quantas histórias como essas continuam sendo silenciadas hoje, ao nosso redor?

  • E o que fazemos, ou deixamos de fazer, diante delas?